sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Ironias

Muito tempo sem escrever, muito tempo sem inspiração, muito tempo sem vontade de escrever. Nesse meio tempo, o mundo entrou em pânico e até o momento ninguém achou a porta de saída. Pânico em um cinema em chamas, normalmente muita gente morre pisoteada pela turba desnorteada.

Brasileiros já estavam desacostumados a tanta crise mas não deixa de ser um filme já visto. Para os habitantes do primeiro mundo era um filme que não viam desde a Segunda Guerra. O mundo ficou louco: os brasileiros privatizaram seus bancos governamentais e venderam as empresas estatais porque o FMI, os grandes bancos internacionais e outros organismos disseram que o livre mercado era a única salvação. E agora o livre mercado reza para que a estatização salve o mundo. Ironias!

terça-feira, 1 de julho de 2008

A classe média que bebe e mata no trânsito

A classe média reclama da violência, das mortes que acontecem por atacado, do domínio do tráfico no Rio de Janeiro, e por aí vai. É também é muito reveladora a reação dos membros da classe média em relação à nova proibição de beber qualquer quantidade de álcool ao se guiar um veículo automotor. Muitos homens e mulheres nas reportagens mostravam suas racionalizações para defenderem o direito de encher a cara e dirigir. Claro que todos afirmaram que duas taças de vinho ou dois copos de cerveja ou um cálice de conhaque não os atrapalham na direção dos veículos. Também é óbvio que nenhum deles disse que dificilmente se limitam a duas doses de qualquer coisa. Quantos colegas eu vi sairem tortos dos bares e pegarem seus veículos. Provavelmente todos sortudos por nunca terem se acidentado mas infelicidade para muitos outros que perderam as vidas por causa de um motorista embriagado. Eles deveriam ir consolar o marido que dias atrás perdeu mulher e os dois filhos ao ter o carro atingido por um caminhão conduzido por um motorista bêbado quando esperavam pelo regresso do chefe da família que foi comprar gasolina para o veículo parado no acostamento por falta de combustível. Deveriam também consolar o homem morto dentro do posto de combustível ao ser atingido por um veículo dirigido por outro motorista bêbado. As estatísticas mostram que a maioria dos acidentes com mortes foram causadas por motoristas que tinham bebido.

A classe média reclama da violência praticada pelos criminosos mas tem um arsenal de desculpas para as milhares de mortes no trânsito brasileiro principalmente porque é a classe média que tem automóveis. A classe média pode beber e dirigir impunemente afinal de conta criminoso é quem usa arma.

Sinceramente só espero que a lei tenha sucesso em diminuir tantas mortes. E eu vou continuar fazendo o que sempre fiz: se beber não dirijo e se dirigir não bebo.

O preconceito nosso de cada dia

Já dizia minha avó que em boca fechada não se entra mosca.

Ontem (30/06) a modelo Isabeli Fontana num programa de TV em rede nacional disse que não gostaria que seus filhos pequenos fossem gays. E um ditado popular também diz que a emenda pode ser pior que o soneto: tentando amenizar o que tinha dito ela acrescentou que conhece gays e que os adora. Aliás o mundo é cheio de gente que adora gays desde que não sejam parentes próximos, assim como muitos têm amigos negros mas não se casariam com eles. Como se gay e negros fossem câncer, falemos, conversemos abertamente sobre o assunto principalmente se a doença acontecer na casa do vizinho.

quinta-feira, 29 de maio de 2008

O trânsito de Sampa

A minha rua e outras em torno do prédio onde moro sempre foram tranqüilas mas agora todos os dias pela manhã estão congestionadas de carros. Todas as reportagens que vejo ou leio mostram que as pessoas que cruzam a cidade de carro gastam duas horas para chegar ao trabalho e outro tanto para voltar. Em cinco horas de trem, com incontáveis paradas, se vai de Nice a Milão. Em cinco horas e meia se viaja entre Rio e São Paulo de ônibus.

Linhas de trem ou de metrô não se constroem de hora para outra e tampouco abertura de novas avenidas resolverá o problema. Para situações de caos, medidas paliativas não resolvem. São Paulo é um boa cidade mas o trânsito está transformando Sampa num inferno.

Esteriótipo

Trabalhei em cartão de crédito e sempre que aparecia um erro em alguma conta de cliente costumávamos dizer: 1 é "alguns", dois são muitos e três são todos. Em miúdos, 2 clientes com o mesmo problema geravam um estresse enorme porque os "terrorristas" de plantão criavam pânico dizendo que todos os clientes tinham problemas, poucas vezes alguém fazia essas afirmações baseado na realidade. Poucos exemplos eram suficientes para a generalização.

Temos idéias pré-concebidas em relação a nacionalidades, religiões e a orientações sexuais. Quantos por aqui têm idéias idiotas em relação a argentinos sem nunca ter cruzado com um na vida. Outros falam mal do modo de vida americano sem nunca ter pisado por lá. E normalmente baseamos nossas opiniões no que lemos sem nunca termos vivenciado. Gente boa e gente má existem em todo canto do mundo, independentemente do sexo, da religião, da cor, da idade, etc. Sempre ouvi dizer que os franceses evitam falar inglês mesmo sabendo. Minha experiência me mostrou que muitos franceses não falam inglês porque não sabem, não porque não gostem.

Generalizar é sempre mais fácil, evita o esforço de aprendizado.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Desigualdade racial

Ontem, 13 de maio, se comemorou os 120 anos do fim da escravidão no Brasil. Olhando os dados referentes aos negros, falta muito ainda para se comemorar. O IBGE diz que até o final deste ano, negros e pardos superarão a população branca. Em 2010, serão a maioria absoluta. A renda dos negros, se mantidos os atuais programas de distribuição de renda, será equivalente a dos brancos apenas em 2040. No domingo veio matéria no jornal dizendo que somente 3,5% dos cargos de chefias eram ocupados por negros. E o Supremo Tribunal Federal deverá julgar se o sistema de cotas para negros vigentes em algumas universidades é constitucional.

Os grupos a favor e contra as cotas esgrimem seus argumentos para embasar suas convicções. O argumento mais usado contra as cotas é que o problema reside na falência do ensino básico que prejudica os mais pobres, grupo no qual se enquadra a maioria dos negros. Sem um ensino básico de qualidade, poucos pobres, incluídos os negros, chegarão à universidade. Eu também acredito que seja verdade porém chegar à universidade não resolverá a questão. Na TV uma procuradora do Distrito Federal, que era contra as cotas, usou o argumento mais batido, surrado e falso para defender sua posição. Segundo ela, o que há no Brasil é o preconceito econômico: negro rico vira branco e pobre branco vira negro.

Para mim os grupos a favor e contra as cotas parecem esquecer que o simples fato de alguém entrar numa faculdade não garantirá que a discriminação deixará de existir. Hoje em dia há muitos negros e pardos com boa educação e que nem por isso ocuparão cargos de chefia. Entre um negro e um branco em condições de igualdade, a maioria das empresas privadas optarão pelo negro.

Quando fazia o mestrado, tive de fazer um trabalho sobre recrutamento e seleção. Eu recorri ao banco onde eu trabalhei e contei com a ajuda da responsável por RH da área onde fui funcionário. Ao me falar dos critérios de seleção, ela me fez a seguinte pergunta: quantos negros você já viu trabalhando no banco? Ela mesmo respondeu, existe uma norma não escrita mas o banco não admite negros. Eu perdi uma chance de ouro de perguntar por que eu e outro colega havíamos sido admitidos.

Há pouco mais de 2 anos, conversando com um colega de trabalhei, ele me disse que estava selecionando pessoas para trabalharem com ele. A mulher de RH do banco ligou para ele dizendo que tinha um candidato mas que havia um pequeno problema, ele era negro. O meu amigo teve de se controlar para não responder indignado porque ele também era negro. E seguramente eu deixei de ser aprovado em entrevistas ou promovido por ser negro. Para a maioria das empresas, negro de terno e gravata é segurança de loja ou de casa noturna. As empresas privadas sempre utilizarão o argumento mágico: o candidato ou funcionário não tem o perfil exigido para tal função.

A discriminação por causa da cor da pele existe e não é apenas uma questão de escolaridade ou de situação econômica. E o pior de tudo é que é quase impossível de ser provada. Não basta dar acesso à universidade, é necessário garantir que os ambientes de trabalho reflitam a distribuição demográfica da população brasileira. Não dá para garantir que não existe preconceito em empresas brasileiras que são tão brancas quanto empresas nórdicas.

As péssimas mudanças

Para não dizer que tudo está na mesma após 8 meses fora de Sampa, o trânsito piorou. O estado caótico do atual trânsito deve-se às políticas públicas que privilegiaram o transporte individual em detrimento do transporte de massa e, ultimamente, ao crescimento econômico. Os financiamentos longos causaram recordes na produção e venda de automóveis, a tecnologia flex dos carros novos permitiu que os motoristas pudessem optar entre o álcool e a gasolina. Desse modo os motoristas brasileiros podem escapar da gasolina cara e encher a cara do automóvel com álcool barato. Resultado final: horas gastas num trânsito que cada vez se move menos.

Ontem na feira fui surpreendido com o aumento de 25% no preço do pastel. Ainda assim continua gostoso e barato, R$ 2,50, o equivalente a menos de € 1 que não comprava nada parecido na Riviera. E os demais preços começam a refletir a alta dos alimentos enquanto computadores ficam mais baratos.

Ontem Marina Silva pediu demissão do cargo de Ministra do Meio-Ambiente. Para muitos ela poderia ser uma chata, inflexível por defender os princípios nos quais acreditava. Em vários órgãos subordinados ao ministério houve casos de corrupção mas nenhum respingou nela que sempre me pareceu íntegra, e sinceramente espero que essa imagem perdure. As desventuras dela no ministério são a faceta do governo petista, e sejamos justos, também dos governos que antecederam. Quando se lê os jornais, tem-se a impressão que a devastação das florestas parece ser causada por gente inescrupulosa que não respeita as leis. De fato é política oficiosa patrocinada pelos governantes da região. No Mato Grosso, o governador é o maior plantador individual de soja do mundo. É a raposa tomando conta do galinheiro e todos fazem cara de espanto e surpresa com o desaparecimento das galinhas.